Equilíbrio hormonal – é o que nos mantém saudáveis e promove o nosso bem-estar. Nos últimos anos, a influência dos desreguladores endócrinos no sistema hormonal tornou-se um assunto de preocupação crescente. Estes desreguladores encontram-se habitualmente em produtos que usamos no dia a dia, incluindo aqueles que são frequentemente utilizados pelas mulheres, como cosméticos, produtos para a pele ou detergentes domésticos. (Nota para os nossos leitores do sexo masculino – sim, estamos cientes de que os homens também os utilizam e por isso podem também beneficiar das nossas recomendações no final deste texto).
Como os desreguladores endócrinos podem afetar significativamente o delicado equilíbrio hormonal, podem também ter implicações de grande alcance para a saúde. É fundamental compreender os princípios básicos do seu funcionamento e o que podemos fazer para proteger melhor a saúde das mulheres.
Os desreguladores endócrinos e a saúde da mulher
Os desreguladores endócrinos (DEs) criam problemas complexos no mundo das hormonas. Trata-se de substâncias que podem afetar o sistema endócrino, uma rede complexa que regula as hormonas (para ler mais sobre os DE, clique aqui).
Resumindo: podem imitar as hormonas naturais ou interferir com a sua produção ou funcionamento, provocando desequilíbrios no organismo e interferindo com muitas funções vitais. As suas capacidades obscuras suscitam preocupações devido à sua omnipresença e aos potenciais impactos a longo prazo na saúde humana e no ambiente.
Os corpos das mulheres, com todas as suas incríveis complexidades hormonais durante a menstruação, a gravidez e a menopausa, podem ser mais sensíveis a estes químicos. Sabemos agora que a exposição aos desreguladores endócrinos pode ter consequências graves que se manifestam de várias formas. Afeta não só a saúde reprodutiva, os ciclos menstruais e a fertilidade, mas também conduz a perturbações no metabolismo e aumenta o risco de certos tipos de cancro, como o cancro da mama ou dos ovários.
Algumas fontes comuns de exposição a desreguladores endócrinos
Os objetos do quotidiano podem expor as mulheres a numerosas substâncias químicas presentes nos plásticos, cosméticos, produtos de higiene pessoal, alimentos (tanto nas embalagens como nos pesticidas dos alimentos) e até nos produtos de limpeza domésticos. Todos estes são exemplos de fontes de desreguladores endócrinos.
Existem três vias de entrada destas substâncias no nosso organismo: por ingestão, inalação e absorção cutânea. A exposição através da pele, especialmente entre as mulheres, constitui uma parte substancial da exposição total a determinados produtos químicos.
A nossa pele, o maior órgão do corpo, pode facilmente absorver substâncias presentes em produtos de higiene e cosméticos. Embora a pele atue como uma barreira que protege o corpo, ela permite que os desreguladores endócrinos entrem na corrente sanguínea e influenciem o equilíbrio hormonal.
Impacto na saúde reprodutiva
Os desreguladores endócrinos podem colocar muitos desafios à saúde de todos, mas hoje vamos centrar-nos na saúde das mulheres.
Estes químicos têm sido associados a ciclos menstruais irregulares, perturbações na ovulação e problemas de fertilidade. A exposição prolongada pode levar a dificuldades em conceber ou manter uma gravidez.
Para as mulheres, quer a maternidade esteja ou não nos seus planos, a saúde reprodutiva é uma componente crucial do bem-estar em geral. De facto, as hormonas reprodutivas desempenham um papel de grande alcance para além da fertilidade, regulando vários aspetos da saúde para além da capacidade de engravidar.
Alguns desreguladores endócrinos estão ligados a uma das perturbações hormonais mais comuns – o síndrome dos ovários poliquísticos (SOP). O SOP é uma doença complexa caracterizada por desequilíbrios hormonais que conduzem a períodos irregulares, quistos nos ovários e potenciais problemas de fertilidade, o que coloca problemas de saúde significativos. Existem produtos químicos, como os ftalatos e os bisfenóis, que têm levantado bandeiras vermelhas devido à sua capacidade de interferir com as hormonas e contribuir potencialmente para o desenvolvimento deste síndrome. Além disso, o SOP não está apenas relacionado com os ovários e a saúde reprodutiva. Esta condição aumenta o risco de diabetes, problemas de colesterol, doença hepática e doenças cardiovasculares – condições que afetam o coração e os vasos sanguíneos.
O impacto dos desreguladores endócrinos na saúde reprodutiva das mulheres não pode ser subestimado. Devemos ter também em conta que a saúde das mulheres e o seu bem-estar impacta também a saúde dos filhos futuros.
Menopausa e alterações hormonais
Falemos da menopausa. Muitas mulheres apresentam vários sintomas, tais como afrontamentos, alterações de humor e perturbações do sono – todos estes são resultados de uma montanha-russa natural, embora desafiante, de alterações hormonais que podem ter um impacto significativo no bem-estar.
Adicionalmente, estas alterações podem ser influenciadas por desreguladores endócrinos, potencialmente exacerbando os sintomas da menopausa e afetando a saúde óssea ou cardiovascular.
A saúde da mama e os desreguladores endócrinos
Estudos sugerem que a exposição prolongada, quer em doses baixas quer em níveis elevados, a desreguladores endócrinos específicos pode estar correlacionada com um risco acrescido de cancro da mama, desequilíbrios hormonais e outros problemas relacionados com a mama.
Substâncias químicas como os parabenos, frequentemente presentes em cosméticos e produtos de higiene pessoal, têm sido estudadas pela sua capacidade de imitar o estrogénio.
Do mesmo modo, a exposição a outros estrogénios externos, como o bisfenol A (BPA), também tem sido associada a um maior risco de desenvolver cancros relacionados com as hormonas, incluindo o cancro da mama.
Proteger a saúde das mulheres – Recomendações práticas
Apesar da omnipresença dos desreguladores endócrinos, é importante tomar medidas proactivas para minimizar a exposição e proteger a sua saúde. Reunimos aqui algumas recomendações fáceis de implementar que podem ajudar a reduzir o contacto com produtos químicos perigosos. Comece por aquilo com que se sente mais confortável e incorpore gradualmente outras dicas.
Nas compras – seleção cuidadosa dos produtos
Opte por produtos rotulados como “sem parabenos”, “sem ftalatos” ou “sem fragrâncias” e procure os que têm um certificado ecológico. A escolha de alternativas naturais, orgânicas ou amigas do ambiente diminui a exposição a químicos nocivos.
Sempre que possível, escolha produtos embalados em vidro ou papel em vez de plástico. Isto aplica-se tanto a cosméticos como a produtos alimentares.
Selecione produtos de origem local e sazonais (para saber mais clique aqui). O consumo de uma dieta equilibrada, rica em frutas, legumes e cereais integrais produzidos localmente não só reduz a exposição a pesticidas, como também promove o bem-estar geral ao fornecer muitas vitaminas.
Em casa
FAÇA VOCÊ MESMO. Utilize produtos de limpeza amigos do ambiente derivados de soluções naturais como vinagre, bicarbonato de sódio, ácido cítrico, etc. Estes não só protegem o ambiente como também são mais benéficos para a sua saúde. Evite substâncias agressivas – soluções altamente antibacterianas são desnecessárias para uso doméstico.
Use apenas o suficiente. Em sueco, existe um termo, “lagom”, que significa a quantidade perfeita – nem demais nem de menos. Considere este princípio quando utilizar cosméticos ou produtos de cuidados da pele. Utilizar uma quantidade mais pequena é muitas vezes suficiente e é também vantajoso para o orçamento familiar e para o planeta.
Assegure uma ventilação adequada, especialmente no seu quarto, antes de dormir. Um sono adequado reduz os níveis das hormonas do stress, beneficiando o seu dia. Além disso, a ventilação dos quartos reduz a presença de produtos químicos perigosos.
Dicas para o Take-away
Transporte o almoço num frasco em vez de num recipiente de plástico. Os recipientes de plástico para guardar alimentos podem aumentar a exposição aos DE. Se já tiver uma caixa plástica para o efeito, avalie o seu estado. Se estiver riscada, danificada ou velha, considere um novo recipiente, possivelmente feito de aço inoxidável desta vez. É fã de frascos de vidro antigos? Nós também, pois são uma ótima opção de desperdício zero! Proteja-os externamente com tecido para evitar danos. Opte por água da torneira em viagem (se for potável na sua zona).
Invista numa garrafa de vidro ou de aço inoxidável e leve-a para onde quer que vá. Em última análise, é uma escolha económica e minimiza a poluição por plástico.
Leve consigo um saco de pano reutilizável. Coloque um na sua mala ou no carro para ir às compras de supermercado e evite a necessidade de comprar sacos adicionais.
Descanse bem
Por último, mas igualmente importante, assegure-se de que tira momentos para descansar. É crucial para o seu corpo relaxar corretamente. Lembre-se, o sono não é apenas uma opção – é uma função humana fundamental. Encontrar tempo para si própria pode envolver um pequeno passeio com a sua música favorita, desfrutar de uma chávena de chá quente à luz das velas ou voltar a contactar alguém de quem tem saudades. As suas hormonas vão apreciar estes esforços!
Partilharemos mais informações sobre como evitar os produtos químicos nas nossas próximas publicações. Fique atenta!
Tomar consciência é a chave. Se já a tem, está na altura de dar o próximo passo.
Compreender a ligação entre os desreguladores endócrinos e a nossa saúde permite-nos fazer escolhas informadas. Ao tomar medidas simples para minimizar a exposição, pode proteger o seu bem-estar e preparar o caminho para um futuro mais saudável. Evitar produtos químicos que possam interferir com as suas hormonas é fundamental. O seu corpo agradecer-lhe-á, recompensando-a com uma versão mais saudável, mais calma e mais forte de si própria.
Recursos para saber mais
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*Autoria
Este artigo é da autoria da Dra. Aleksandra Rutkowska – investigadora (nas áreas da biotecnologia e medicina molecular) e inventora- e da Dra. Aleksandra Olsson – nutricionista clínica, investigadora e perita em educação. Foi traduzido para português pela equipa da ZERO no âmbito do projeto europeu LIFE ChemBee (LIFE21GIE/DE101074245)